Você é uma bailarina que ajuda outras bailarinas?

Quando ouço alguém dizer, “Eu cheguei onde cheguei sozinha, sem a ajuda de ninguém”, eu rolo meus olhos para cima e solto um suspiro profundo. Por um único motivo: é mentira.

A menos que uma pessoa viva isolada em uma ilha e o seu olimpo seja construir uma cabana com as próprias mãos, ninguém atinge o seu objetivo sozinha. Sempre haverá pessoas em seu caminho que vão torná-lo possível. A mãe que costurou o figurino por noites seguidas. O pai que deu carona em todos os espetáculos. A professora que estendeu a aula até mais tarde. A diretora da companhia que enxergou uma grande bailarina em potencial. A responsável que pagou as mensalidades, as roupas de aula, as sapatilhas, as taxas do teatro. O ensaiador que explicou a sequência da coreografia pela vigésima quinta vez.

Esses anjos do caminho são fáceis de serem reconhecidos, porque o apoio é mensurável. Sem figurino você não dança, sem chegar ao teatro você não dança, sem técnica você não dança, sem uma companhia você não dança, sem dinheiro para bancar seus estudos você não dança, sem coreografia você não dança.

Mas há um outro tipo de apoio muito importante, o pontual, que surge do nada. Uma palavra amiga, uma explicação de um passo, um vídeo compartilhado, um livro emprestado, um “você soube que abriram audições para tal lugar?”, um sorriso cúmplice. É aqui que entra “a bailarina que ajuda outras bailarinas”.

Ilustração: Libby VanderPloeg.

Em um ambiente tão exigente e rígido como o do ballet clássico, é fácil agir da mesma maneira. Para ser cruel, é um passo. Quantas de vocês já sofreram com críticas e atitudes de colegas? Eu passei por algumas situações bem chatas. As piores nem foram comigo, mas coisas que presenciei e não intervim porque eu não era a professora. Muitas bailarinas ficaram pelo caminho porque não foram respeitadas, não apenas como artistas, mas como pessoas.

“O que vou fazer agora, jogar confete em todo mundo?”

Calma, bailarina, deixe o confete para o carnaval. Não falo da bajulação, do elogio vazio, da falsidade para conquistar a confiança de alguém. Falo do comentário sincero, do incentivo verdadeiro, do reconhecimento que estamos todas no mesmo barco.

“Sua pirueta é tão limpa, acho lindo!”
“Nossa, que diagonal, parabéns!”
“Seu colo de pé está ótimo, não se preocupe, mais que isso vai ser uma dificuldade para girar.”
“Não fale assim do seu corpo e vamos comer juntas depois da aula.”
“Quer que eu explique essa sequência? É assim, ó…”
“Tenho mais ponteiras aqui, fique com essas para você.”
“Vou te enviar um vídeo de uma coreografia incrível.”
“Você dança bem sim, quem disse que não?”

E, talvez, o comentário mais importante: “É claro que você pode dançar”.

Todo mundo ouviu em algum momento que não pode dançar, seja diretamente ou de maneira velada. E, por favor, não venham com o discurso autoajuda de “Não desista, siga seus sonhos, não ligue para os outros”, porque nós vivemos em sociedade. Sim, o que os outros dizem e fazem impactam diretamente a nossa vida. Só nos esquecemos de uma coisa: os outros somos nós. O que dizemos e fazemos impacta diretamente a vida das pessoas ao nosso redor.

Será que já destruímos os sonhos de alguém sem saber? Em vez disso, sejamos aquelas pessoas que constroem os sonhos dos outros. Valerá a pena para todo mundo.

2 comentários sobre “Você é uma bailarina que ajuda outras bailarinas?

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